E todas as nossas ilustríssimas convidadas tiveram o carinho de nos atender e responder às perguntas que eu, como fã, elaborei pra elas! As respostas são lindas, inspiradoras, engraçadas e cada uma mostra um pouquinho da sereia que existe dentro delas!
pra começar: quem é a tatiana zanardi
Tatiana Rotondaro Zanardi, natural de São Paulo, onde morou por 41 anos. Trabalhou durante 20 anos na Editora Abril na área de tecnologia, chegando a Gerente de Tecnologia da Informação e depois Gerente de Tecnologia Educacional. Nos últimos anos na empresa, era responsável por todos os websites e pelo conteúdo digital da Abril Educação, assim como da área de eventos e assessoria pedagógica. UFA!
No ápice de sua carreira, decidiu pedir demissão e mudar o rumo de sua vida ao lado do marido, Alcides Falanghe. Em novembro de 2010 se apaixonaram, um amor à primeira vista como ela relata, pelo Ocean Eyes, um catamarã Voyage de 43 pés. Desde então, vivem no Caribe trabalhando com mergulho e charter e atualmente residem nas Ilhas Virgens Britânicas.
E começa a entrevista…
- IPA Dive: Como começou sua história no mar?
Tatiana Zanardi: Sempre fui apaixonada pelo mar, desde criança ia para praia com minha família e adorava ficar simplesmente olhando o mar. Em 1992 e em 1993 fui para Fernando de Noronha e fiz batismos de mergulho, e fiquei apaixonada pelo fundo do mar e sua vida exuberante. Em 1994, fui para o Tahiti e novamente fiz mais um batismo.
Em 1995, minha mãe me falou de um curso de mergulho que estava tendo na USP (Universidade de São Paulo), perto de casa, e decidimos fazer juntas. Afinal, estava cansada de ficar fazendo batismos e queria ir nos pontos mais bacanas, aqueles que os mergulhadores certificados vão. No começo tive medo, fiquei apreensiva por muito tempo até pegar experiência e mais confiança em mim mesma.
Mas o fascínio pela diversidade da vida marinha, pela paz, pelo silêncio, pela “calmaria” que existe no fundo do mar sempre me fascinaram e motivaram a querer mergulhar mais e mais.
Minhas viagens sempre foram focadas pelos lugares com pontos de mergulho, e assim, ao longo destes anos todos, tive a oportunidade de conhecer lugares magníficos com o Alcides, como o Mar Vermelho, Maldivas, África do Sul, Galápagos, Revillagigedo, Austrália, Ilhas Salomão, Ilhas Fiji, Seychelles, Polinésia Francesa, Tailândia, Myanmar, Caribe, Bahamas e logicamente todo o litoral e algumas cavernas do Brasil.
- IPA Dive: Qual foi o gatilho pra decidir velejar e mergulhar?
Tatiana Zanardi: O que nos motivou a vender tudo em São Paulo (apartamento, carros, etc) e mudar de mala e cuia para o barco na verdade foram diversos fatores. Estávamos cansados da vida urbana e enlouquecedora de São Paulo, e não nos imaginávamos morando em nenhuma outra cidade grande. Sempre tivemos a vontade de conhecer e mergulhar em todos os lugares do mundo, e a melhor forma de fazer isso seria certamente morando em um barco.
Eu estava cansada da rotina infindável do dia a dia, que fazia com que todos os dias parecessem iguais e que a vida estava escorrendo pelas minhas mãos.
Em 2009 fizemos uma viagem de 20 dias embarcados para mergulhar na Austrália e nas Ilhas Salomão, e esse foi o empurrão final. Decidimos que era a hora de colocar o plano no papel, aproveitar nossa saúde e disposição para uma mudança radical na vida.
Planejamos a mudança durante quase dois anos, desde o processo de pesquisa do barco até o curso de capitão amador (o Alcides já era mestre amador desde 1980, eu tive que fazer todos os cursos de arrais, mestre e capitão amador). Sem falar nos inúmeros livros sobre navegação que devoramos antes de partir. Pensando nas possibilidades que eu teria pela frente, fiz cursos também em áreas diversas: gastronomia, gestão ambiental e edição de vídeo. Mal sabia que todos seriam extremamente úteis na minha nova vida.
Nós vivemos a bordo do catamarã à vela Ocean Eyes desde março de 2011, sendo esta a nossa primeira experiência de viver em tempo integral a bordo. Antes disso, já havíamos feito muitos live aboards para mergulho (hospedagem em barco especializado para o mergulho autônomo, no Brasil e no exterior), mas nunca havíamos morado em um barco.
- IPA Dive: Quais seus medos no mar? Como busca superar esta dificuldade?
Tatiana Zanardi: Mar bravo sempre me deixa apreensiva. Por isso, sempre checamos a previsão do tempo antes de fazer travessias para evitar mal tempo. Porém, sempre tem uma nuvem preta cuspindo raios e trovoadas que assustam, aí o jeito é respirar “lenta e profundamente”, como diz o Jornada da Naui, usar todas as técnicas para vencer o medo e esperar passar (vale rezar terço, conversar com os anjos da guarda, respiração de ioga, ser pragmático e não se PRÉ-ocupar, enfim, vale tudo!).
- IPA Dive: O que mais te fascina no mergulho/vela?
Tatiana Zanardi: A falta de rotina e a sensação de liberdade. Podemos escolher o “bairro” e a “vizinhança”, planejar onde queremos estar e visitar lugares diferentes, ou voltar para os lugares que mais gostamos. Basta checar a previsão do tempo, levantar as velas e ir. Agora somos donos do nosso tempo.
O contato constante com a natureza para nós é algo rejuvenescedor. A vida é muito mais saudável e natural.
Não digo que é mais tranquila, pois temos que constantemente estarmos alertas para a previsão do tempo, para o bom funcionamento do barco, para encontrar o que precisamos nas ilhas. Um dia nunca, mas absolutamente nunca, é igual ao outro. Isso poderia ser um inferno para algumas pessoas, que precisam da rotina para se sentirem seguras. Para nós isso é estimulante e motivador. E o melhor, cada momento fica gravado fortemente em nossas memórias!
- IPA Dive: Um lugar que ainda sonha em mergulhar e velejar…
Tatiana Zanardi: Meu sonho é poder continuar vivendo no mar, não importa aonde, desde que me sinta segura no lugar.
sobre ser uma mulher do mar…
- IPA Dive: Como mulher, o que você acredita que te atrapalha no mergulho ou na vela? Como resolve?
Tatiana Zanardi: Força física. Não consigo carregar cilindros nem subir a vela com a facilidade que o Alcides faz. Poderia me exercitar mais, focar em ganhar força e chegar lá, o que seria super possível. Porém não sou tão adepta a exercícios assim…. Gosto de nadar, mergulhar, caminhar. Mas não deixo de fazer nada por conta disso.
Aprendi que com calma, paciência e técnica, consigo fazer as mesmas coisas do meu jeito.
Além do mais, vejo por aqui muitas senhoras com mais de 70 anos morando em veleiros e fazendo tudo de igual para igual com o marido, com calma e paciência. Uma vez mergulhei com uma senhora japonesa de 83 anos em um live aboard na Grande Barreira de Corais na Austrália, inclusive com tubarões. Ela tinha feito o curso aos 74 anos e estava viajando sozinha. Quer exemplo melhor que esse?
- IPA Dive: Você sente alguma barreira no mergulho ou na vela por ser mulher? Sente que as pessoas te discriminam e não te respeitam?
Tatiana Zanardi: Nunca senti isso, nem no mergulho e nem na vela. Minha experiência de vela é praticamente toda fora do Brasil, e aqui é absolutamente normal mulheres velejadoras fazerem tudo a bordo, de marinharia a mecânica. Eu até acho engraçado quando alguns homens se preocupam e querem me ajudar nas minhas tarefas de “skipper”, como abrir a genoa, pegar a poita, ancorar, etc. Querem ser gentis, mas são tarefas normais para mim e educadamente digo que está tudo sob controle.
- IPA Dive: A sua menstruação te impede de mergulhar ou velejar?
Tatiana Zanardi: Não. Sempre mergulhei e velejei independentemente da menstruação. O máximo que pode acontecer é tomar um remedinho para a cólica e pronto!
- IPA Dive: O que você diria para qualquer pessoa que te dissesse que o mar não é lugar para mulheres?
Tatiana Zanardi: Que ela não sabe o que está falando…
- IPA Dive: Você é vaidosa? Quais cuidados toma para manter a beleza no mar e na terra?
Tatiana Zanardi: Não muito…. Nunca fiz questão de fazer a unha, maquiagem, arrumar o cabelo, etc. Não abro mão de depilação (faço eu mesma), cortar as pontas do cabelo (corto eu mesma também) e usar bons hidratantes para o corpo e cabelo e protetor solar. That’s it!
- IPA Dive: Mergulho ou velejar emagrece? Quais benefícios do mergulho e da vela pra mulher?
Tatiana Zanardi: Sim, eu acho que emagrece. No mergulho perdemos calorias por estarmos nos exercitando e compensando a temperatura do corpo com a água, sempre mais fria. A vida a bordo também envolve exercício constante, e no mar e no calor não dá aquela fome que temos em terra e em lugares frios. Vitamina D é de graça, basta ficar no sol, e a umidade do ar faz bem pra pele. Quem sofre um pouco é o cabelo, que fica ressecado até, mas aí um creminho resolve!
A vida a bordo
- IPA Dive: Qual a memória mais incrível que você tem de um mergulho ou velejada?
Tatiana Zanardi: Os mergulhos com grandes animais, como tubarão baleia em Galápagos, tubarão branco e tigre na África do Sul, baleias jubarte nas Ilhas Turks e Caicos. Minhas primeiras velejadas pelas Ilhas Virgens Britânicas, pelas trapalhadas que fizemos,
pela sensação de que aquele era meu novo mundo, e pela conquista realizada.
- IPA Dive: Qual seu principal objetivo no veleiro?
Tatiana Zanardi: O Projeto Oceano Vivo, que na verdade é a linha mestra da nossa viagem. Fazemos coisas variadas o tempo todo. Velejamos, mergulhamos, filmamos, fotografamos, recebemos hóspedes a bordo, exploramos novos lugares. Mas sempre temos em mente o objetivo do projeto, que é documentar em foto e vídeo as mudanças que estão ocorrendo em nossos oceanos, para melhor ou para pior.
Infelizmente estamos assistindo a uma degradação galopante do oceano, de quando comecei a mergulhar em 1995 para agora. Os fatores são inúmeros e juntos estão alterando a química do mar e, consequentemente, da vida. Não é questão de salvar esse ou aquele animal, mas o ser humano!!! Isso ninguém entende e não pensa, mas todos os estudos apontam para uma situação extremamente crítica para a vida na Terra até 2050.
Por isso, respeitamos e pedimos que todos respeitem as regras do ambiente marinho onde vivemos. Nas Ilhas Virgens, por exemplo, pede-se para usar poitas principalmente e ancorar somente em fundos de areia, nunca em recifes (óbvio!!!) ou de grama (seagrass, onde vivem raias, tartarugas e inúmeros seres). A caça sub é proibida, pesca somente com licença, e coleta de lagostas somente nativos com licença comercial, fora da época do defeso.
Sempre recolhemos o lixo que encontramos debaixo d’água, desde a costumeira rede de pesca enroscada em corais até uma TV de tela plana abandonada no fundo do mar. O ser humano é realmente surpreendente com a porquice que consegue fazer em nossos mares!
Não temos patrocínio para o projeto e sabemos que, atualmente, com a crise que afeta o mundo todo, isso é praticamente impossível. É mais um objetivo pessoal mesmo, sem finalidade financeira, apenas para tentar fazer algo de útil para o planeta.
- IPA Dive: O que você faz no seu dia a dia para poder mergulhar e velejar?
Tatiana Zanardi: A vida a bordo já é o suficiente para me manter em forma. Hahaha! Como não temos carro, caminhamos para todos os lugares e carregamos peso para cima e para baixo. Fazer faxina no barco é um ótimo exercício para alongamento e contorcionismo, e ajuda a suar bastante também.
Nadar e mergulhar da popa do Ocean Eyes é um exercício maravilhoso, um dos motivos pelos quais escolhemos o Voyage foi pela facilidade de entrar e sair da água. Caio no mar sempre que possível. A meditação vem naturalmente na hora do pôr-do-sol, da velejada, da lua cheia.
E minha alimentação é variada, como um pouco de tudo (e bebo também), sem exageros, seguindo o que meu corpo pede. Tem dia que ele pede alface, tem dia que ele pede hambúrguer com Coca-Cola, e por aí vai! Hahaha! Mas, no geral, comidas leves. Sem exageros, e com equilíbrio, dá tudo certo no final!
- IPA Dive: Qual seu prato favorito? Qual sua bebida favorita?
Tatiana Zanardi: Pizza e vinho!
- IPA Dive: Precisa ter muito dinheiro para mergulhar/velejar?
Tatiana Zanardi: Depende do que você chama de muito dinheiro, de quanto tempo você espera ficar mergulhando/velejando, e aonde você quer mergulhar e velejar. Dá para velejar e mergulhar com pouco dinheiro por pouco tempo em lugares baratos. Agora se você quer viver a bordo a médio e longo prazo, com conforto mínimo a bordo (banho, energia elétrica, geladeira, etc) em lugares diferenciados, velejando e mergulhando, penso que ter uma boa renda fixa é necessário sim.
A ideia de que viver somente do mar e do barco é possível, na prática não funciona. Caso contrário uma hora você terá que voltar para terra e arranjar um emprego tradicional novamente. Planejamento é essencial. Uma coisa é realizar o sonho, outra bem diferente e talvez até mais difícil, é manter-se nele.
- IPA Dive: Uma mulher que te inspira. Por quê?
Tatiana Zanardi: Minha mãe. Pela força, pensamento positivo, jovialidade, alegria, determinação, independência, enfim, por tudo que ela é e me ensinou.
- IPA Dive: Como se vê daqui a 10 anos? Ainda no mar? Fale um pouquinho de seus planos.
Tatiana Zanardi: Pergunta difícil… Pretendo viver intensamente o agora e o futuro próximo (até 2018), depois a gente vê o que acontece, mas espero ainda estar no mar…
pra terminar: a dica para as leitoras do blog
- IPA Dive: Quais dicas você daria para uma mulher iniciante no mergulho e na vela?
Tatiana Zanardi: Aprender sempre, confiar em si mesma, não desistir, buscar conhecimento, seguir o próprio ritmo, não se comparar às outras pessoas, acreditar que é possível. Mas tudo isso só funcionará se você realmente quiser essa vida e essa experiência por si mesma, e não por causa de outras pessoas ou por outros motivos.
- IPA Dive: Se vc tivesse que mandar 1 única mensagem às mulheres para incentivá-las a irem pro mar, qual seria?
Tatiana Zanardi: Acredite que você consegue, dê o primeiro passo e vá fundo!
considerações finais e agradecimentos especiais
Quase desnecessário encerrar essa entrevista maravilhosa que a queridíssima Tatiana Zanardi nos concedeu! Inspiradora demais! Humilde demais e absolutamente verdadeira!
Eaí? Deu vontade de começar a planejar tudo?? Pois então comece mesmo! Porque semana que vem tem mais uma entrevista imperdível!!
Gostaria de agradecer o carinho e dedicação da Tati com a gente do IPA Dive! Desde a primeira vez que nos conhecemos, foi química! Tanto eu como JP adoramos o casal! Gostinho de quero mais foi uma realidade! Um casal extremamente doce e sensível! E, certamente, não poderiam ficar de fora desta campanha que foi criada com muito carinho mesmo! Além que terem uma história fantástica!
Esperamos que todos tenham se emocionado e inspirado com as palavras da Tati! <3
Super beijo e até a próxima entrevista! =)